segunda-feira, 5 de setembro de 2016

A (In)constitucionalidade do Artigo 1.790 do Código Civil e a Sucessão do Companheiro.







Olá caros leitores, está para ser votada no Supremo Tribunal Federal a ação que discute quanto a (In) Constitucionalidade do Art. 1.790 do Código Civil.


Antes de adentrarmos no mérito da questão, imperioso se fazer tecer alguns esclarecimentos:


Como é sabido, o artigo 1.723 do Código Civil aduz que “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.” e no mesmo sentido, o art. 226, § 3º da Constituição Federal de 1988, in verbis: “Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. (...) § 3º Para efeito de proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.”


Embora a Carta Magna tenha equiparado a união estável ao casamento, é certo que o legislador, ao tratar acerca dos direitos sucessórios, ao redigir o art. 1.790, deu tratamento diferenciado ao companheiro, vejamos:

“Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes:

I – se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;

II – se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles;

III – se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança;

IV – não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança”.


Ao analisarmos tal artigo e seus incisos, notamos com clareza que o companheiro não consta na ordem de vocação hereditária, mas que ele terá direito tão somente aos bens adquiridos de forma onerosa na vigência da união estável, sendo excluído da sucessão dos bens recebidos a título gratuito, doação ou sucessão.


Assim, temos que a norma não está tratando acerca da meação do companheiro, mas tão somente da sucessão e herança, independentemente do regime de bens adotado pelas partes. Ademais, podemos afirmar também, que o companheiro é herdeiro e meeiro, uma vez que quando há o silêncio das partes quanto ao regime de bens a ser adotado, presume-se que o regime adotado é o da comunhão parcial de bens, conforme o art. 1.725 do Código Civil.


Quanto à análise dos dois primeiros incisos do art. 1.790, é possível notar um evidente equivoco, uma vez que o inc. I, preceitua que se o companheiro concorrer com os descendentes – filhos comuns de ambos, ele terá direito a uma quota equivalente à que por lei, for atribuída ao filho. Já o inc. II, se concorrer com os descendentes, “tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles”.

Deste modo, é forçoso concluir que o inciso I também incide às hipóteses em que estão presentes outros descendentes do autor da herança.

Já o inc. III preconiza que se o companheiro ou convivente concorrer com outros parentes sucessíveis (leia-se os ascendentes e os colaterais até quarto grau), terá direito a um terço da herança. Existem alguns julgados que reconhecem a inconstitucionalidade dessa previsão, uma vez que coloca o companheiro em posição muito desfavorável em relação a parentes longínquos, com os quais muitas vezes não se têm qualquer contato social. Já o inc. IV aduz que não havendo parentes sucessíveis – descendentes, ascendentes e colaterais até o quarto grau, o companheiro terá direito à totalidade da herança.


Assim, ao compararmos o art. 1.790 com o 1.829 ambos do código civil, é possível ver com clareza que o companheiro possui menos direitos sucessórios que o cônjuge, o qual é considerado herdeiro necessário, diferente do companheiro, vejamos: “Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;

III - ao cônjuge sobrevivente;

IV - aos colaterais.”


Feitos tais esclarecimentos, os quais não deixaram dúvidas quanto ao tratamento diferenciado do cônjuge e companheiro na sucessão hereditária, temos que, caso o Supremo Tribunal Federal entenda pela inconstitucionalidade do Art. 1.790 do Código Civil, cônjuge e companheiro serão tratados com igualdade quando da sucessão hereditária. Afinal, se a própria Carta Magna assegura ao casal o direito de constituir a entidade familiar que desejar, seja casamento ou união estável, ela não pode puni-los com atribuição de direitos desiguais quando da vocação hereditária.



Jamille Ammar Ruocco

Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Curitiba

Especialista em Direito Contemporâneo

Aprovada no Exame da Ordem

Foi colaboradora na Comissão Estadual da Verdade do Paraná - Teresa Urban

Assessora de Magistrado na Vara de Família e Sucessões de Curitiba

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